Reflexos da guerra no Seguro Agrícola

Reflexos da guerra no Seguro Agrícola

Nos últimos dias, estamos nos deparando com os desdobramentos de uma absurda guerra envolvendo a Rússia e Ucrânia, a qual além de ensejar uma crise humanitária sem precedentes está a gerar reflexos negativos que atingem a diversos outros setores.

Em razão das inúmeras sanções impostas à Rússia, a exportação de produtos e matérias-primas para o resto do mundo por tal país resta totalmente afetado, o que acarreta, por consequência, forte impacto na economia de diversos outros países.

Dentre os setores a serem afetados pela escassez de insumos se faz presente a agricultura, uma vez que dos principais produtos que o Brasil importa da Rússia são os defensivos agrícolas e fertilizantes. Atualmente, cerca de 85% dos fertilizantes consumidos no Brasil tem origem estrangeira, o Brasil ocupa a 4ª posição mundial com cerca de 8% do consumo global de fertilizantes, sendo que no ano de 2021 a Rússia atendeu a 23% das importações de fertilizantes feitas pelo nosso país.

Frente a tal cenário, o Governo Federal, no dia 11/03/2022, lançou o Plano Nacional de Fertilizantes objetivando reduzir a importação de insumos, assim como abrandar a dependência do produtor rural brasileiro em relação aos produtos de outros países, minimizando a sua vulnerabilidade frente às oscilações do mercado internacional, além de fomentar a produção nacional. Todavia, tal planejamento traz medidas a serem adotadas a longo prazo, ou melhor dizendo, para os próximos 28 anos.

Em sendo assim, a curto prazo, a escassez interna de insumos agrícolas e impossibilidade de importação frente às penalidades impostas à Rússia e repercussões já é tema que vem sendo debatido pelo setor agrícola. Se tem em vista que as próximas safras sofrerão forte impacto, uma vez que a redução do uso de defensivos e fertilizantes pelos produtores trará como implicação a redução de produtividade, fato que demandará uma maior atenção pelo mercado segurador.

Usualmente os contratos de seguro agrícola trazem em seus clausulados a clara obrigação dos segurados na condução da cultura de acordo com as recomendações técnicas dos órgãos oficiais (semeadura e germinação adequada, trato do solo, combate às pragas, atenção ao zoneamento, etc.) durante o período de vigência da apólice, sob pena de resultar em agravamento do risco, facultando o cancelamento das apólices ou a perda do direto à indenização.

A teor da regra legal, em especial da leitura do “caput” do artigo 757 do Código Civil, a seguradora obrigar-se-á pelos riscos predeterminados, ou então, riscos assumidos, de sorte que sua interpretação possibilita a eleição de riscos sobre os quais recairá a cobertura securitária, bem como a exclusão daqueles que não pretende garantir, sendo dever do segurado o pagamento do prêmio devido, a prestação das informações necessárias para a avaliação do risco, além de cumprimento das obrigações avençadas.

Neste tipo de contrato a boa-fé deve estar caracterizada pela verdade e lealdade nas informações prestadas pelas partes e cumprimento das obrigações ajustadas, nos termos dos artigos 422 e 765 do Código Civil.

Logo, com isso, os segurados precisam de se abster de praticar quaisquer atos que possam gerar a modificação do risco ou o seu agravamento.

No entanto, a carência de defensivos agrícolas e fertilizantes no mercado – o que se configura elemento essencial para um bom manejo da cultura – frente ao impacto da guerra e questões internas que ensejam a carência de tais produtos – ainda que se configurem circunstâncias alheias à vontade dos segurados, poderá vir a demandar uma redobrada atenção por parte dos produtores na busca de soluções alternativas que lhes garanta a continuidade da condução das lavouras seguindo as normas técnicas recomendadas, sob pena aplicação da previsão de perda do direito à garantia ante o agravamento intencional do risco objeto do contrato, consoante preconizado pelo artigo 768 do CCB.

Diante de tal cenário, a exemplo do que já está acontecendo com os combustíveis, a falta de fertilizantes e defensivos poderá ainda gerar o aumento de preços, e, por consequência, o aumento do custeio pelo produtor rural e até mesmo uma possibilidade de retração na comercialização das apólices em virtude deste alto custo.

Destarte, não há dúvidas de que as seguradoras que comercializam apólices de seguro agrícola precisam estar atentas e preparadas para tais impactos, inclusive reavaliando seus produtos de forma a melhor atender ao consumidor que poderá vir a sofrer diversos prejuízos, conforme exposto, pelas circunstâncias, ao cabo, independem da sua vontade.

  • Artigo escrito pela advogada e sócia do C. Josias & Ferrer Maria Izabel Indrusiak Pereira

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