O PRINCÍPIO DA BOA-FÉ NO ÂMBITO DOS CONTRATOS SECURITÁRIOS

O PRINCÍPIO DA BOA-FÉ NO ÂMBITO DOS CONTRATOS SECURITÁRIOS

A DOENÇA PREEXISTENTE E A RECENTE (E POLÊMICA) DECISÃO DO STJ

O PRINCÍPIO DA BOA-FÉ NO ÂMBITO DOS CONTRATOS SECURITÁRIOS
Artigo do Dr. Lorenzo Tremarin que auta no Escritório da C Josias & Ferrer Advogados Associados no Depto. de Seguro de Pessoas

A origem do seguro remonta a séculos ante de Cristo, quando as caravanas cruzavam os desertos do Oriente para comercializar camelos. A árdua travessia e a consequente perda de alguns animais fizeram com que os comerciantes firmassem um acordo no qual pagariam o camelo de quem o perdesse.
Na modernidade, o primeiro contrato de seguro nos moldes atuais, remonta ao ano de 1347, quando em Gênova, foi emitida a primeira apólice de seguros.
Claramente, o homem sempre buscou resguardar a propriedade, até que, no ano de 1583, em Londres, foi emitida a primeira apólice de seguro de vida que se tem notícia.
Desde então, os contratos de seguros recebem constantes melhorias, ampliando os segmentos e diversificando para uma enorme gama de produtos que visa garantir os interesses tanto das seguradoras, quanto dos segurados. Sempre presente o elemento da boa-fé contratual.

Hodiernamente, todos os contratos entabulados no Brasil (dentre eles, seguros) são redigidos sob o princípio da boa-fé objetiva, tendo como legislação norteadora o Código Civil de 2002, cujo seu artigo 422 traz a seguinte redação:

Art. 422. Os contratantes são obrigados a guardar, assim na conclusão do contrato, como em sua execução, os princípios de probidade e boa-fé.
Nos contratos em questão, novamente o legislador resguardou-se ao redigir os artigos 765 e 766, trazendo a previsão de que ambas as partes têm o dever de guardar a mais estrita boa-fé e veracidade e, no caso de o segurado por si só ou representante, fizer declarações inexatas ou omitir circunstâncias que afetariam a aceitação, perderá o direito a garantia.
Em que pese haja a previsão legal da boa-fé contratual, há um longo embate jurídico travado entre as partes quando o tema em questão é a doença preexistente, o preenchimento da DPSA (declaração pessoal de saúde e atividades) e o sinistro ocorrido. Não podemos dizer que o entendimento é pacificado a ponto de não ser necessária a análise de cada caso especificamente.
Contudo, em recente decisão (11/04/2018), a Terceira Turma do STJ editou Nova Súmula que afetará as relações segurado/seguradora, bem como o futuro das decisões judicias. A nova orientação aniquila com o princípio da boa-fé contratual, que até então, era, quiçá, umas das poucas certezas da segurança jurídica estabelecida entre as partes.
Ora, se a boa-fé rege o contrato, basta a inverdade para que a mesma esteja ferida morte. Não há que falar em prova da má-fé.
Súmula 609: A recusa de cobertura securitária, sob a alegação de doença preexistente, é ilícita se não houve a exigência de exames médicos prévios à contratação ou a demonstração de má-fé do segurado.

De acordo com a redação apresentada, para os novos contratos de seguro, a seguradora deverá precaver-se com a exigência de exames médicos prévios realizados pelo segurado, com o que, consequentemente, deverá contratar os serviços de médicos especialistas para a análise destes exames, dificultando a aceitação e encarecendo o produto oferecido. Ou seja, a aceitação da proposta irá onerar novamente o segurado.

Contudo, o que realmente impressiona na redação apresentada é a necessária demonstração de má-fé do segurado
Mas o que seria a demonstração de má-fé do segurado?
Retornemos à boa-fé contratual.

É consabido que a boa-fé deve ser observada pelas partes na fase de negociações preliminares e após a execução do contrato, quando tal exigência decorrer da natureza do mesmo.
Nos seguros de vida, há a exigência no preenchimento da DPSA (negociações preliminares). Por óbvio, nesse tipo de declaração a zona entre o desconhecimento, a omissão e a falsidade são nebulosas. E assim sendo, havendo o desatendimento ao princípio da boa-fé e o agravamento do risco, em função da omissão de informação essencial à concretização do pacto, restaria demonstrada a má-fé do segurado, independentemente de prova da mesma. Basta omitir a informação.

Ao que tudo indica, a novel súmula vai de encontro aos princípios norteadores dos contratos e, a demonstração de má-fé do segurado se trata de prova diabólica. É aguardar para ver como os tribunais recepcionarão tal entendimento.

Lorenzo Tremarin